“A história da paternidade no Ocidente está marcada por uma tensão entre paternidade biológica, paternidade social e paternidade legal. Esta tensão é comum a hetero e homossexuais em situações ou projectos familiares, mas é de alguma forma dramatizada nas situações, na sua maior parte homossexuais, em que não exista provisão legal, por parte do Estado, da legalidade das situações
homoparentais. Igualmente, quanto menos provisão legal exista, menos parece haver uma cultura de como fazer e proceder em situações de disputa de paternidade entre gays e lésbicas, assistindo-se ao recurso ou à normatividade legal, ou à normatividade moral (e necessariamente heteronormativa, androcêntrica e patrilinear) a ela associada. Esta realidade denota-se ainda das páginas dos manuais sobre homoparentalidade, produzidos pela comunidade LGBT de alguns países, onde é comum encontrar-se avisos e conselhos sobre este tipo de problema.
Portugal é uma sociedade que atravessa um momento de forte ambiguidade. Por um lado, e no contexto europeu, a democracia portuguesa não atingiu o nível avançado na política sexual já atingido pela Espanha; por outro lado, não se encontra numa situação de homofobia institucionalizada como em alguns países da Europa, quer do Sul, quer do Leste. Do lado positivo, Portugal dispõe de uma lei das uniões de facto, de uma constituição que proíbe explicitamente a discriminação por orientação sexual, e de um debate público e político que certamente conduzirá à legalização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Do lado negativo, Portugal, além de ainda não ter essa igualdade formal no casamento, tem uma ressalva negativa em relação à adopção por casais homossexuais e na sua lei de procriação medicamente assistida veda o acesso por parte de mulheres sozinhas e por casais de mulheres.
Tal não tem impedido a reprodução entre as pessoas e casais homossexuais.
Além dos muitos casos de filhos tidos em relações heterossexuais anteriores, os gays e as lésbicas portugueses têm recorrido a formas de reprodução que passam sobretudo pelas seguintes estratégias: o recurso à procriação medicamente assistida no estrangeiro, sobretudo em Espanha, por parte das mulheres; o recurso a um dador amigo, com ou sem definição de futuro envolvimento parental deste; projectos de co-parentalidade, com um/a amigo/a ou casal; o recurso à adopção singular com ocultamento da (ou prévio à) existência de um/a parceiro/a.
É fácil imaginar as complicações que podem advir do quadro legal existente. É bem mais fácil produzir fisicamente uma criança do que (re)produzir um quadro de parentalidade e convivência familiar posterior ao nascimento da criança. Essas dificuldades prendem-se, por um lado, com o quadro legal e, por outro, com a dinâmica familiar e parental que o nascimento de uma criança espoleta, e que depende de múltiplos factores, que vão desde a gestão dos aspectos práticos da vida até às qualidades específicas das relações de amizade, afectividade e conjugalidade das pessoas envolvidas. (…)”
Miguel Vale de Almeida
homoparentais. Igualmente, quanto menos provisão legal exista, menos parece haver uma cultura de como fazer e proceder em situações de disputa de paternidade entre gays e lésbicas, assistindo-se ao recurso ou à normatividade legal, ou à normatividade moral (e necessariamente heteronormativa, androcêntrica e patrilinear) a ela associada. Esta realidade denota-se ainda das páginas dos manuais sobre homoparentalidade, produzidos pela comunidade LGBT de alguns países, onde é comum encontrar-se avisos e conselhos sobre este tipo de problema.
Portugal é uma sociedade que atravessa um momento de forte ambiguidade. Por um lado, e no contexto europeu, a democracia portuguesa não atingiu o nível avançado na política sexual já atingido pela Espanha; por outro lado, não se encontra numa situação de homofobia institucionalizada como em alguns países da Europa, quer do Sul, quer do Leste. Do lado positivo, Portugal dispõe de uma lei das uniões de facto, de uma constituição que proíbe explicitamente a discriminação por orientação sexual, e de um debate público e político que certamente conduzirá à legalização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Do lado negativo, Portugal, além de ainda não ter essa igualdade formal no casamento, tem uma ressalva negativa em relação à adopção por casais homossexuais e na sua lei de procriação medicamente assistida veda o acesso por parte de mulheres sozinhas e por casais de mulheres.
Tal não tem impedido a reprodução entre as pessoas e casais homossexuais.
Além dos muitos casos de filhos tidos em relações heterossexuais anteriores, os gays e as lésbicas portugueses têm recorrido a formas de reprodução que passam sobretudo pelas seguintes estratégias: o recurso à procriação medicamente assistida no estrangeiro, sobretudo em Espanha, por parte das mulheres; o recurso a um dador amigo, com ou sem definição de futuro envolvimento parental deste; projectos de co-parentalidade, com um/a amigo/a ou casal; o recurso à adopção singular com ocultamento da (ou prévio à) existência de um/a parceiro/a.
É fácil imaginar as complicações que podem advir do quadro legal existente. É bem mais fácil produzir fisicamente uma criança do que (re)produzir um quadro de parentalidade e convivência familiar posterior ao nascimento da criança. Essas dificuldades prendem-se, por um lado, com o quadro legal e, por outro, com a dinâmica familiar e parental que o nascimento de uma criança espoleta, e que depende de múltiplos factores, que vão desde a gestão dos aspectos práticos da vida até às qualidades específicas das relações de amizade, afectividade e conjugalidade das pessoas envolvidas. (…)”
Miguel Vale de Almeida